
Sabem – já experimentaram de certeza –, aquele contentamento doce e silencioso, que nos faz fechar os olhos e nos deixa em paz com a natureza, essa alegria contida que se basta a si mesma? É o que sinto com os meus cinco livros deste mês: não me lembro de um Agosto de cujos ramos se dependurassem livros como estes.
A começar pelo Atlas da II Guerra Mundial. É bom e é monumental, quase o dobro do formato dos nossos outros Atlas Históricos, 24 cm de largura por 31 de altura. E é o mais sistemático atlas da II Guerra: todas as batalhas, todos os exércitos, num livro que é uma revolução gráfica, obra de vários historiadores, com organização de Jean Lopez, numa investigação multidisciplinar de três anos. Para recordar essa guerra que começou há 86 anos no dia 1 de Setembro de 1939, fonte da tremenda onda de dor e morte que varreu a Europa e o mundo.
Da antítese da guerra que é ou deveria ser a literatura, fala-nos o espanhol Felipe Díaz Pardo em A literatura universal em 100 Perguntas. E eu disse «fala-nos» e não «escreve-nos» porque estas 100 Perguntas são a conversa de sonho que sempre quisemos ter sobre «o que tem o vinho que ver com o nascimento do teatro» ou «qual o escritor que melhor usou o monólogo interior» ou «se é possível encontrar Dostoiévski no local do crime». São 300 páginas de sabedoria, surpresas e de um divertissement efervescente: champanhe, ah pois!
E agora olhem bem para o orgulho deste editor: estão a ver-me a ulular de prazer na varanda? Não admira: é o que acontece a qualquer editor que possa publicar, com um cheirinho de «inédito» a enobrecer-lhe o café, o grande Luiz Pacheco. A culpa é toda, e redondíssima, do Nicolau Santos. Foi o Nicolau que convidou o irascível Pacheco a escrever crónica in illo tempore no Diário Económico e no Público. Para isso mandaram cartas, trocaram confidências, traficaram inconfidências. E ficaram provas de tudo. Num precioso livrinho, Bater sempre também cansa… mas às vezes até é pouco, estão reunidos os textos que testemunham a nua – sim, nua – e linda sinceridade e genialidade da escrita de Luiz Pacheco e a sua desassombrada visão da vida e da criação literária. E, poderia lá faltar, a sua – ohhh! – «percepção» de algumas grandes figuras da nossa intelectualidade. Setenta e duas páginas de ouro.
Falta-me falar de dois romances que chegam às livrarias em cima da nossa rentrée literária. Publico, pela segunda vez, Evelina Gaspar. No seu O Destino Português de Sam, Evelina traz na mão um homem real, o artista Sam Abercombry. É um australiano, pintor, que se apaixonou por Portugal e, obsessivamente, pelo nosso mito sebastianista. Vive connosco há 30 anos e é feliz em Portugal! E andamos nós a chorar baba e ranho pelos cantos. Vamos, mas é, ler este romance e dar com Sam saltos de canguru.
Fecho com o meu amigo luso-angolano Onofre dos Santos. Este é o seu quarto romance comigo e se o título – O Último Romance de Camilo – vos faz pensar que Onofre abandonou os temas angolanos dos livros anteriores, estão perdidamente enganados. Agora, como é que Onofre arrasta o velho Camilo Castelo Branco para África e lhe põe na boca a palavra Angola… Ou será que é tudo um pretexto e Camilo, salvo o caixote que lhe chega de Malanje, nunca sairá de Portugal, Porto e Seide?
São os meus cinco livros de Agosto, frutos maduros pendurados nos ramos do Verão. Um dos pêssegos é Luiz Pacheco. Há editores felizes.
Manuel S. Fonseca, editor






