Se eu disser que o livro é um coração e que esse coração só bate no peito do leitor, acreditam em mim? Se não acreditam em mim, pelo menos acreditem nos meus autores, António Costa Silva e Fernando Venâncio: os romances que eles escreveram são corações à procura de um peito.
Desconseguiram Angola é o romance que, em dor e riso, em angústia e (des)esperança, António Costa Silva – sim, esse que foi nosso ministro, mas que viveu em Angola a utopia e o quase fuzilamento – criou como homenagem aos que, mesmo no olho de um furacão de caos e miséria, fazem prevalecer o riso limpo: «a farra estava nice… Luanda de sábado à noite.» Tanta dor, tanto humor.
Já Fernando Venâncio – sim, o autor do perfeito Assim Nasceu uma Língua – vai, no seu romance Os Esquemas de Fradique, em busca do coração dessa personagem que fugiu dos livros de Eça para a vida. Tudo se passa hoje, numa vida malandra, em beijos, cinemas e boa comida e bebida, e tudo se passa em longínquos «ontens», que nos revelam de Fradique a descendência, as amantes, a vocação até para espião do rei. Tão bem escrito.
E se querem saber a razão de o coração de Primo Levi nunca ter deixado de bater no seu peito, apesar do cativeiro em Auschwitz, vão ter de ler este O Homem que Salvou Primo Levi, de Carlo Greppi. Descobrirão Lorenzo, homem das obras, e uma história real de compaixão, que nos faz acreditar no humano: ó que esplêndido coração, agora na celebração dos 80 Anos da Libertação de Auschwitz.
E 2025 é também o ano em que celebramos os 80 anos do Fim da II Guerra Mundial. O que se passou, depois, na vencida Alemanha? O professor Emmanuel Droit, ao leitor que anda à caça de diamantes, explica tudo, numa narrativa densa, em A desnazificação, pós-história do III Reich: quem se escondeu, quem assumiu responsabilidades, quem «nada viu, nada ouviu» de 1933 a 1945.
Voltando aos meus leitores: o que eu gosto do leitor sonhador e individualista, que tudo reinterpreta, fazendo de cada livro trampolim para a cada ideia associar mais ideias. São esses os leitores que vão querer ler Inteligência Artificial, Bênção ou Maldição, de Diogo Freitas, um empreendedor e CEO que não teme a polémica: jura-nos que a IA veio para ficar, mas que com a IA veio também uma caixa de Pandora de malefícios, agora exposta nas 160 páginas deste livro.
E para os leitores que no sentido de cada frase mordem as delícias das camadas de um mil folhas, guardei duas gemas filosóficas: O Ouriço e a Raposa, de Isaiah Berlin e Como é que é ser um morcego, de Thomas Nagel.
Berlin, em O Ouriço e a Raposa, a propósito da filosofia da história de Tolstoi, ensina-nos que uma raposa sabe muitas pequenas coisas, enquanto o ouriço se obstina a saber só uma coisa muito importante. Shakespeare era uma raposa, Marx, um ouriço. E o leitor? Não sei se pelo ouriço ou pela raposa, o livro esgotou: aqui está reeditado, novinho em folha.
Já o filósofo Thomas Nagel apanhou um grande susto quando um morcego lhe entrou no escritório lá de casa. E o morcego? Terá ficado tão assustado como ele? Combinando filosofia, psicologia e neurociência, Como É Que É Ser um Morcego é uma revolucionária digressão sobre «a consciência», sobre o «objectivo» e o «subjectivo»: pode a experiência subjectiva ser objecto de uma descrição objectiva? Um ensaio que exige à ciência uma expansão que acomode o que não está de acordo com a concepção física da objectividade.
Sete livros da Guerra e Paz para leitores que sabem que só se reconhece uma verdade profunda pelo facto do seu oposto ser também uma verdade profunda.
Na Crisântemo, juntando-se a três livros anteriores de Sigmund Freud, sobre os sonhos, o narcisismo e o princípio do prazer, chega agora, em nova tradução, Três Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade, alto escândalo de 1905. Freud sustenta que a perversão sexual faz parte da natureza humana, e aqui se inauguram conceitos como o complexo de castração, complexo de édipo e inveja do pénis. Uma inveja de livro.
Contemporâneo e português é o livro Liderar é um Acto de Amor. Fábio Castro, o autor, confessa-se: «A parentalidade é o melhor curso de autoconhecimento que alguma vez experimentei.» E liga, com razão, a parentalidade a uma profunda transformação da vida pessoal e familiar. Mas também da vida profissional. Uma boa surpresa, sem perversões.
Na Euforia, o ano começa com o sabor transgressor (perverso?) do pecado. De Sierra Simone, a quem já devíamos o bestseller Padre, publicamos agora Pecador: a mesma liberdade erótica, com Deus de novo à mistura. A protagonista vai, em breve, ser freira. Mas há uma cama (ou várias) a separá-la da vocação.
E vamos lá sair da cama, que 2025 e as livrarias estão à espera dos leitores para lhes porem no peito um merecido coração.
Manuel S. Fonseca, editor