Cartas de Amor, gorjeios e passarinhos

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São Valentim vem a caminho, há eflúvios amorosos no ar, é possível que uns desalmados pássaros gorjeiem nos jardins e que se vejam ramos de rosas vermelhas debaixo dos braços dos utentes do Metro e da Carris. Ou seja, vem aí o Dia dos Namorados. Falemos então de amor. E o melhor, até por sermos uma editora, o melhor talvez seja “escrever de amor”. Lembro este fantástico livro – AS GRANDES CARTAS DE AMOR. Reúne cartas de figuras famosas, Freud, Marx e Nietzsche, Virginia Woolf e Mark Twain, Florbela Espanca e Beethoven. Napoleão também. Todos – poetas, militares, músicos, psicanalistas, reaccionários ou comunistas – escreveram cartas de amor. É um livro inspirador, que se lê com o coração nas mãos, e que pode muito bem levar-nos a escrever também a quem muito amamos. Deixo-vos aqui uma das cartas, lembrando que, no livro, todas as cartas são contextualizadas para que se saiba a quem porquê e em que condições foram escritas. Boa leitura

Lord Byron
O jovem coxo e inseguro transformou-se em cisne com a magia da escrita e George Gordon Byron, que tivera uma infância mal-amada em que era
maltratado inclusive pela mãe, tornou-se com a fama um Don Juan requisitado por inúmeras mulheres, muitas delas porque não encontravam felicidade no seu casamento e procuravam neste romântico poeta a ternura com que sonhavam. E Lord Byron, a quem o título aristocrático
configurou o nome artístico, dava-lhes tudo o que elas queriam — pelo menos até garantir o amor incondicional que procurava e que, uma vez alcançado, quase o aborrecia. Caroline Lamb foi uma das suas primeiras «vítimas». Apaixonado por ela e ciumento do seu marido, seduziu-a a tal ponto que a jovem aristocrata estava pronta a sacrificar a sua reputação para fugir com ele, fazendo cenas e ameaçando suicidar-se à frente de amigos. O problema é que ele já não queria fugir com ela! Depois de pôr um ponto final nesta escandalosa ligação, acabaria por casar com a prima desta, Annabella Millbanke, que prometia uma avantajada herança. Mas o casamento durou pouco: os rumores das suas aventuras homossexuais e de uma relação incestuosa com a sua meia-irmã, Augusta Leigh — em grande parte fruto da vingança da namorada abandonada —, serviram de fundamento à dissolução do casamento. O fim do matrimónio foi o ponto de partida para o exílio de Lord Byron, que foi ao encontro dos seus amigos, Percy Bysshe Shelley e Mary Godwin, exilados na Suíça com outra das suas aventuras, Claire Clairmont, que sofreu o cabo das tormentas quando percebeu a inconstância do poeta, já depois de ter uma filha dele. Teresa Guiccioli foi o seu último amor. Conheceu-a em Itália, já desgastado por
trinta anos de uma vida louca, e a bela jovem tinha acabado de sair do convento para casar por conveniência com o conde de Guiccioli. Apaixonado, escreveu nessa altura grande parte do Don Juan e jurava que queria assumir esta relação de forma oficial, mas a sua morte inesperada não nos deixa perceber se a condessa teria de facto conseguido mudar este tão inconstante amante. 

De Lord Byron para Caroline Lamb
Agosto de 1812
Minha Querida Carolina,

Se as lágrimas que viu e que sabe que eu não costumo derramar, se a agitação na qual me separei de si — agitação que deve ter percebido durante toda esta nervosa situação e que começou quando se aproximava o momento de a deixar —, se tudo o que tenho dito e feito e que ainda estou disponível para dizer e para fazer não foram prova suficiente de que os meus sentimentos por si são e serão sempre verdadeiros, não tenho nenhuma outra prova para oferecer.
Deus sabe que eu lhe desejo muita felicidade e, agora que a deixo, ou, melhor dizendo, agora que o seu sentido de dever para com o seu marido e a sua mãe a obriga a deixar-me, deve saber que tudo o que prometi é verdade e que mais ninguém ocupará o seu lugar na minha afeição, que lhe será somente a si reservado até eu ser pó.
Até este momento nunca conheci esta loucura — minha querida e amada amiga, não me consigo expressar, este não é o momento para palavras —, mas terei orgulho, um prazer melancólico em sofrer o que não consegue imaginar porque não me conhece. Estou a ponto de ir, de coração pesado, porque a minha presença esta noite irá deter qualquer história absurda que os acontecimentos desta noite possam originar. Pensa agora que sou frio,
severo e ardiloso — talvez os outros pensem isso, talvez a sua mãe o pense —, essa mãe a quem devemos muito sacrifício, eu muito mais ainda do que ela jamais saberá ou possa imaginar. 
«Promessas de não a amar». Ah! Caroline, são promessas do passado — mas atribua todas as cedências ao motivo certo, e nunca deixe de sentir tudo o que já testemunhou e aquilo que só pode ser sentido pelo meu coração, e talvez pelo seu. Que Deus a proteja e a abençoe agora e para sempre.
Seu mais apaixonado
Byron

P. S.: Estas provocações que a conduziram a isto, minha queridíssima Caroline, não foram só para a sua mãe e as suas relações, haveria alguma coisa no céu ou na terra que me fizesse mais feliz que ter-te há muito tempo tornada minha? Não menos agora do que então, mas mais agora do que nunca, sabe que desistiria com prazer de tudo aqui e além-túmulo por si e, abstendo-me disto, devem os meus motivos ser mal entendidos? Não me importo com quem sabe disto e que uso é feito disto, só estão em dívida para consigo, eu fui e sou livre e inteiramente seu, para obedecer, honrar, amar e voar consigo quando, onde e como pode e quer determinar.

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