Uma guerra verdadeira

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Os trabalhos e os dias de um editor
Manuel S. Fonseca

Cresci com a Guerra Colonial em Angola. Tinha 7 anos quando aconteceu o 4 de Fevereiro, nessa noite em que os «heróis quebraram as algemas» como cantava o hino do MPLA, a que o velho regime salazarista ripostou com o «Angola, Angola é nossa». Durante treze anos vi chegar e partir soldados e, em 1974, vi a guerra mudar de rosto. Do rumor surdo que viera do mato durante esses anos, quase intangível para os habitantes da cidade, passou-se à tonitruante guerra global, na sangrenta guerra da independência de Angola, pela qual deambulei dois anos, estava eu nos meus verdes 20 anos.

Todos os testemunhos sobre a guerra são imprescindíveis. Nos livros de História cada guerra tem um nome, uma identidade, uma interpretação, princípio e fim. Mas, humanamente, a guerra é vivida como experiência pessoal singular e intransmissível por cada um que nela tomba. Este Declarações de Guerra, de Vasco Luís Curado, espelha bem, na diversidade e pluralidade dos testemunhos que recolhe, essa ideia. É um livro de experiência, de canções de experiência e de perda de inocência. Vasco Luís Curado, psicólogo clínico, que trabalha com veteranos de guerra, recolheu e seleccionou esses testemunhos. Muito melhor do que eu, dá-nos as razões para lermos hoje – hoje mesmo – este seu livro. Ouçam-no:

«Em tempo de pandemia, prospera a metáfora da guerra.

Para unir a população, nada é mais mobilizador do que comparar o vírus contagioso a um inimigo, as estratégias para a debelar a um combate, os profissionais de saúde a combatentes na linha da frente. Disciplinamo-nos como soldados num quartel, em obediência às instruções de isolamento social preventivo.

Em Declarações de Guerra, os veteranos da guerra colonial relembram-nos que, entre nós, há quem tenha vivido uma guerra verdadeira. Temos muito a aprender com eles: lendo o seu testemunho, percebemos o que é ser um combatente, sem a retórica, por vezes ilusória, de uma metáfora.»

E, para sentir a crua intensidade dos discursos vividos, sem véus, leia este excerto.

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