Como ler Pessoa? Com absinto ou ópio?

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Nasceu uma nova coleccção na Guerra e Paz editores. Chama-se Os Livros de Fernando Pessoa. O primeiro já chegou às livrarias. Chama-se Absinto, Ópio, Tabaco e Outros Fumos e nele se juntam os textos de Fernando Pessoa & Heterónimos que falam ou se inspiram em drogas, do álcool ao ópio, da morfina ao tabaco. Em breve, com o título Tenho Medo de Partir, apresentaremos uma outra antologia. Trata, como bem depreenderam, de viagens – sobretudo das viagens de quem nunca consegue ou se atreve a sair do Cais. A selecção dos poemas e prosas de Pessoa & Companhia é deste vosso editor. Junto também textos de apresentação. 

É, claro, um livro de vícios. Ou do vício. E se perguntarem de quem, direi que é a pergunta errada. Em nada e para nada nos interessa ir de pá e
picareta escavar-lhe arqueologicamente a biografia e saber se Pessoa se embebedava, se afundava no ópio ou se espetou alguma agulha morfinómana no delicado braço. Por mais que tenha feito tudo isto ou a mínima destas coisas, o que neste livro conta é a forma como os vícios, as drogas americanas que entontecem, lhe iluminam a escrita. Os poemas e os textos deste livro bebem absinto e vinho louro, e tanto fumam ópio como deitam fora um cigarro meio fumado.

Este Absinto, Ópio, Tabaco e Outros Fumos vai dar uma animada conversa. É já na 3ª feira, dia 17, na Bertrand do Chiado. Reparem bem na tremenda variedade das bocas que vão estar à conversa: Eugénia de Vasconcellos, poeta e ensaísta; Júlio Resende, compositor e pianista; Jorge Barreto Xavier, professor e programador cultural. É às 18:30 e preciso que venham todos. Mostro-vos já o convite, primeiro, e logo a seguir um dos textos desta surpreendente antologia.

Dou a palavra a Bernardo Soares:

«A arte livra-nos ilusoriamente da sordidez de sermos. Enquanto sentimos os males e as injúrias de Hamlet, príncipe da Dinamarca, não sentimos os nossos – vis porque são nossos e vis porque são vis. O amor, o sono, as drogas e intoxicantes, são formas elementares da arte, ou, antes, de produzir o mesmo efeito que ela. Mas amor, sono, e drogas tem cada um a sua desilusão. O amor farta ou desilude. Do sono desperta-se, e, quando se dormiu, não se viveu. As drogas pagam-se com a ruína de aquele mesmo físico que serviram de estimular. Mas na arte não há desilusão porque a ilusão foi admitida desde o princípio. Da arte não há despertar, porque nela não dormimos, embora sonhássemos. Na arte não há tributo ou multa que paguemos por ter gozado dela. O prazer que ela nos oferece, como em certo modo não é nosso, não temos nós que pagá-lo ou que arrepender-nos dele.»

Já viu as capas? Começa aqui uma colecção. É boa ideia começar já a guardar os cromos: são uma delícia.

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